Memoriário - Livro Escrito por José Dauster
05:51 Postado por Geremias Pignaton
Foto: Embaixador Jório Dauster, filho do autor do livro, responsável pela publicação
Por indicação do Primo Ruberval, que o achou pesquisando a história de Ibiraçu, li o livro Memoriário, escrito pelo médico José Dauster .
O livro foi publicado depois da morte do autor pelo filho Jório Dauster, famoso diplomata de carreira, especializado em comércio exterior, que foi presidente da Vale do Rio Doce e é um tradutor literário consagrado. Das traduções de Jório, constam duas das maiores obras do Século XX, O Apanhador no Campo de Centeio e Lolita.
O autor narra episódios da infância ocorridos nas três primeiras décadas do século passado, desde o seu nascimento até a mudança para a cidade do Rio de Janeiro. Ele nasceu e viveu os primeiros anos de sua vida em Pau Gigante, hoje Ibiraçu.
O livro é um documento importantíssimo para a história da cidade. Os relatos são ricos em detalhes que descrevem a cidade, desde os aspectos paisagísticos e arquitetônicos, passando pelo ambiente cultural, até a descrição de personagens importantes daquela remota época.
José Dauster viveu na cidade no período em que Ibiraçu começou a fazer parte do mundo. Isso se deu com a passagem da linha de ferro Vitória a Minas, nos idos de 1906. Até então, os habitantes do local viviam isolados, tendo sua comunicação feita pelo porto de Santa Cruz, por onde escoavam a produção agrícola, sobretudo café, e de onde recebiam produtos e informações. A viagem para o porto de Santa Cruz, descrita no livro, demandava um dia inteiro em dois trechos, um no lombo de animais ou a pé até Córrego Fundo e o outro em canoas.
São 42 páginas de leitura leve e agradável, apesar de ter sido escrito nos anos 50, com linguagem da época. Algumas passagens são de uma beleza emocionante, sobretudo se o leitor for conhecedor da cidade e de sua história. A passagem do brilhante Cometa Halley em 1910 - não o apagado de 1986 - no céu de Ibiraçu, por sobre o Morro das Freiras, a descrição da mexerica nativa - chamada na época de laranja-cravo-, a escola do professor Dr. Oscar e a origem do nome "Dauster" são narrativas impagáveis.
Também impagável é o posfácio escrito pelo filho Jório Dauster. É uma peça de 6 páginas com um imenso valor literário. Confesso que fiquei muito emocionado durante a leitura. Ora me arrepiava, como quando escuto um música muito bela; ora enchia os olhos de água, como quando vejo uma cena emocionante no cinema. O filho produziu uma homenagem maravilhosa ao pai e nos possibilitou melhor entendimento daquilo que lemos no corpo do livro. A narrativa do acidente do olho e a compreensão do problema vivido pelo pai, fato este quase omitido por ele no livro, chega a ser poético.
Por falar em omissão, o livro tem uma muito forte. Entretanto, esta falha é compreensível, dada a cultura da época. Pouco se fala dos imigrantes italianos.
Na verdade, a cidade surgiu a partir do momento que a produção dos colonos ganhou força e o governo precisou montar uma aparato estatal no local. Aí chegaram as autoridades e as instalações estatais que, junto com a igreja e um incipiente comércio, começaram a formar o núcleo urbano.
Os italianos que chegaram como substitutos da mão de obra negra na qualidade de colonos começaram a prosperar. Eles tinham uma enorme capacidade de trabalho e um conhecimento em agricultura muito maior que os nativos. Meu pai narrou-me muitas vezes que os brasileiros tinham uma certa inveja dos italianos, sobretudo as autoridades. Não era admissível que aqueles colonos ignorantes analfabetos conseguissem mais riquezas que os nativos educados e doutores. Esse tipo de preconceito contaminou a cultura da sociedade da época, perdurando por várias décadas, até por volta dos anos 60. Talvez tenha sido essa a razão da falha da narrativa do autor.
Na verdade, a cidade surgiu a partir do momento que a produção dos colonos ganhou força e o governo precisou montar uma aparato estatal no local. Aí chegaram as autoridades e as instalações estatais que, junto com a igreja e um incipiente comércio, começaram a formar o núcleo urbano.
Os italianos que chegaram como substitutos da mão de obra negra na qualidade de colonos começaram a prosperar. Eles tinham uma enorme capacidade de trabalho e um conhecimento em agricultura muito maior que os nativos. Meu pai narrou-me muitas vezes que os brasileiros tinham uma certa inveja dos italianos, sobretudo as autoridades. Não era admissível que aqueles colonos ignorantes analfabetos conseguissem mais riquezas que os nativos educados e doutores. Esse tipo de preconceito contaminou a cultura da sociedade da época, perdurando por várias décadas, até por volta dos anos 60. Talvez tenha sido essa a razão da falha da narrativa do autor.
José Dauster era filho de Domício Martins, comerciante de Pau Gigante que foi vários anos prefeito da cidade.
No livro, uma coisa me intrigou. O prefácio parece uma peça feita à parte da publicação, os tipos foram impressos de forma diferente dos demais, em negrito, composto por uma trovinha seguida de alguns pequenos parágrafos e assinado pela Prefeita Naciene e seu marido. Daí conclui-se que eles têm, desde antes da publicação, conhecimento da obra. Não entendo como, vista a importância dessa obra para a cidade, eles, que comandam a cidade há mais de duas décadas, não divulgaram o livro por toda a sociedade. Dá a impressão que o esconderam deliberadamente.
Acho que esse livro deve ser do conhecimento de todo o povo de Ibiraçu. Deve ser distribuído ao povo, principalmente aos estudantes, pela importância de seu conteúdo histórico. Acho que não só em Ibiraçu, também em Aracruz, cuja narrativa alcança na parte sobre Santa Cruz.
Para acessar o arquivo em PDF do livro, digite no google "memoriário josé dauster". Para quem lê devagar como eu, é pouco mais de meia hora de agradável e emocionante leitura.
7 de janeiro de 2012 às 02:16
Já havia ouvido falar do José Dauster ou do filho, não sei. Não sabia do livro e também por sugestão do Ruberval li na internet. O livro é um achado. Pela narrativa, pela importância e como você disse bem, pela emoção. Li na quinta- feira e ontem dei uma olhada na biblioteca municipal e, ao que parece, não existe esta obra lá. Uma pena. Deveria ser utilizado nas escolas, como tema de trabalhos sobre nossa cidade.
Desde o tempo de Narceu de Paiva, pouco se fez pela nossa memória. Cultura parece ter se transformado em alguma coisa turístico-religiosa. Aos poucos vamos esquecendo nossa história, apagando nossa memória e incorporando às tradições um tipo de neo-cultura (seja lá o que for isso!) baseada em sabe-se lá o que. Meu medo é que o hip-hop seja considerado, no futuro, uma tradição.
Conversei sobre o assunto dias atrás com o atual Presidente da Câmara, Vanderlei Alves da Silva. O vereador me falou de um projeto para resgatar e resguardar documentos e objetos que sejam, de alguma forma, significativos para nossa história. Muitos desses documentos que eu pude ver com o Professor Narceu, acredito que estão com sua viúva, Dona Aridene. Coloquei-me a disposição para ajudar no que estiver ao meu alcance e citei algumas pessoas que poderiam contribuir também, incluídos Ruberval e o Professor Silvestre, com quem comentei o assunto. Não sei se houve andamento no projeto.
Ruberval, uma coisa podemos dizer de suas teorias: já produziram um excelente resultado com a revelação deste livro.
7 de janeiro de 2012 às 02:35
Algumas passagens da narrativa me tocaram com mais emoção pelas lembranças de algumas coisas que ficaram vivas até a minha infância. Quando ele falava dos banhos de rio meio escondidos, em excelentes “banheiros” e da grande quantidade de peixes e camarões; e das brincadeiras de “ladrão fugido” pela cidade, a noite. Na minha época era “polícia e ladrão”. Ótimas lembranças!
7 de janeiro de 2012 às 08:51
Guti, ele falou na gurizada pescando à unha camarões, lagostins e cascudos. Os meninos enfiando as mãos em locas onde os bichos se escondiam. Fiz muito isso até lá pelo meio dos anos 70. Além, claro, das brincadeiras de pique-turma à noite e dos maravilhosos banhos nos rios com mergulhos dos barrancos.
7 de janeiro de 2012 às 15:26
Recomendadíssimo este livro!!!
Realmente, um achado literário!!!
Tinha ouvido falar de Dauster que foi a Ibiraçu quando era presidente da Vale do Rio Doce.
Na ocasião, o Jório Dauster, filho do José Dauster, autor do livro, neto de seu Domício, o qual deu inicío a esta bela história, foi a Ibiraçu a convite do casal mais badalado de nosso município.
Jório saiu de Ibiraçu constrangido, pois o que parecia ser uma homenagem, revivendo a história, acabou sendo alvejado com um pedido de liberação de verba para construção de uma passarela. Constrangimento total!!!
Anos mais tarde, a Vale, que tanto ajudou Ibiraçu, acabou sendo motivo de ataques extremamente profundo do ex-deputado de Ibiraçu.
Pelo que me consta, até hoje a relação entre Vale e Ibiraçu andam mais do que estremecidas.
Também, não é para menos!!!
São estrondos deste naipe que nos fazem ter a certeza de que um relâmpago ou um raio são apenas manifestações da natureza, nada que se iguale a ações como a descrita acima, com as quais estamos cansados de lidar.
Só não vê quem não quer!!!!
O pior é que quando não vemos uma obra da importância como a do Dauster ser divulgada em Ibiraçu ficamos sem saber qual o verdadeiro motivo disto não acontecer.
Será que foi falta de conhecimento dos que um dia promoveram a obra não divulga-la como deveria ter sido, ou então a história foi abafada para que os espasmos megalomaníacos dessem conta de que o Cometa Halley em Ibiraçu tem outro nome?????
Apesar de saber que tudo gira em torno do marketing político, posso até estar enganado, mas nada em Ibiraçu parece não poder superar "Odorico"!!!
Uma lástima!!!
Vida que segue.
Carlos Cacau Furieri
8 de janeiro de 2012 às 02:25
Cacau, foi isso que eu disse para o sujeito. Raio é uma manifestação da Natureza. Mas ele tentou me provar por A + B que a administração tinha culpa por falta de manutenção e por falta de testes! (risos) /// Muitas vezes, no afã de defenderem seus pontos de vista as pessoas esquecem o bom-senso.
8 de janeiro de 2012 às 10:17
Putz, vc disse tudo, Guti!!
No afã tudo pode acontecer !!!!
Até a perda do bom senso!
Mas isso também relativo, pois depende do ponto de vista?!!
9 de janeiro de 2012 às 01:17
Fico feliz de contribuir na divulgação deste livro para a cidade de Ibiraçu. Este post é o mais lido do blog nos últimos tempos. O número de acesso da página dele é muito grande. Ibiraçu precisa conhecer sua história. Todo povo precisa ter o referencial da história.
9 de janeiro de 2012 às 02:13
Não é não, Cacau. O bom-senso é um conceito absoluto. Pontos de vista não influenciam o bom-senso. O bom-senso é que influencia os pontos de vista.
9 de janeiro de 2012 às 09:06
Guty, há controvérsias!!
E muitas!!!
Tem muita coisa que considero bom senso e os outros não consideram.
Aliás, é bem por essa linha de absoluto mesmo!!!
Abraços.
Carlos Cacau Furieri
9 de janeiro de 2012 às 14:29
Guti e Cacau, todo mundo acha que tem bom senso.
No caso em discussão, acho que tem menos bom senso que defende a administração municipal.
Sei que acham que eu não tenho bom senso, mas eu me julgo um cara muito sensato. Dou umas escorregadinhas, mas isso, como diria aquele sábio vencedor do BBB, faz parte.
9 de janeiro de 2012 às 14:53
"Tem muita coisa que considero bom-senso e os outros não consideram".
"acho que tem menos bom-senso quem defende a administração municipal".
Ambas as expressões acima são pontos de vista.
11 de janeiro de 2012 às 04:13
Apesar de concordar que o bom senso é “absoluto”, diferentemente do ponto de vista, que cada um tem o seu; as pessoas seriam enquadradas na definição do bom senso absoluto tendo pouco, muito, nenhum e por aí vai... de bom senso. No entanto, esta definição do que é o bom senso absoluto, ou seja, a unidade básica do bom senso não existe. Portanto, de acordo com o ponto de vista de cada, a percepção da unidade básica do bom senso varia. Por isso, que no fim, cada um acha que tem bom senso, e o absolutismo do mesmo se esvanece.
12 de janeiro de 2012 às 13:37
Li o livro e amei. Apesar de não ser ibiraçuense, moro aqui há alguns anos. Tambem acho que deveria ser divulgado e fiquei com vontade de saber mais sobre alguns personagens, tipo o Dr. Foscolo Ghelfi e Jacinta Guideth. Podem me ajudar?
Pode mandar pelo seu blog, Gerê, pois leio todos os dias.
15 de fevereiro de 2012 às 13:53
Eu sou caipira, matuto mesmo, nasci ali em Santa Rosa/Aracruz.
Estou adorando seu Blog Gerê, através dele tô conhecendo mais um pouco de minha região e suas histórias e tambem as estórias contadas por ti.
Vou ler Memoriário - o Livro Escrito por José Dauster.
Abcs a todos
Mario Francisco Candeias Dias